O instituto jurídico do bem de família objetiva proteger a família garantindo uma forma de habitação ao proprietário do imóvel e seus familiares que lá residem (regra geral). O bem de família é um direito não se confundindo com a residência (imóvel) sobre o qual incide.
Esse direito, como o conhecemos hoje, surgiu em 1836 através da Constituição da República do Texas, recém separado do México. Há indícios rudimentares desse instituto na época do direito romano também.
Importante dizer que se trata Bem de família Legal ou Obrigatório (Lei 8.009/90) em contrapartida do Bem de família voluntário ou convencional (artigos 1.711 a 1.722 do Cód. Civil).
Exercitando esse direito o imóvel onde a família se instala (tem sua residência) se torna impenhorável e inalienável, “enquanto forem vivos os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade” (há muitas controvérsias sobre essa afirmação entre as aspas; explicaremos mais a frente).
Uma das questões bem discutidas mas já também razoavelmente bem delineadas diz respeito ao Significado de Família. Seria uma única pessoa? Duas? Tem que ser parentes? Em que grau de parentesco.
Diz nossa Constituição Federal em seu Artigo 226:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
A impenhorabilidade é o elemento fundamental do instituto do Bem de Família, sendo o bem resguardado contra execução por dívidas (em regra).
O STJ – Superior Tribunal de Justiça interpretou extensivamente a proteção da moradia e atingiu o imóvel onde reside pessoa solteira, separada ou viúva, conforme Súmula 364:
“O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas“.
Na união entre pessoas do mesmo sexo também temos configurado uma entidade familiar. O Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça afastaram qualquer dispositivo que contrarie esse direito de união em decisões muito bem fundamentadas. Acesse aqui e leia
JURISPRUDENCIAS:
1. A Corte já assentou que indeferida a impenhorabilidade em decisão não atacada por recurso, sobre esta desce o manto da preclusão. 2. É possível a penhora da parte comercial do imóvel, guardadas as peculiaridades do caso, mesmo sem que haja matrículas diferentes.
3. Recurso especial conhecido e provido.(STJ, 3ª Turma, RESP 515122/RS, DJU 29.03.2004, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito)
I – Os bens inalienáveis são absolutamente impenhoráveis e não podem ser nomeados à penhora pelo devedor, pelo fato de se encontrarem fora do comércio e, portanto, serem indisponíveis. Nas demais hipóteses do artigo 649 do Código de Processo Civil, o devedor perde o benefício se nomeou o bem à penhora ou deixou de alegar a impenhorabilidade na primeira oportunidade que teve para falar nos autos, ou nos embargos à execução, em razão do poder de dispor de seu patrimônio.
II – A exegese, todavia, não se aplica ao caso de penhora de bem de família (artigo 70 do Código Civil anterior e 1.715 do atual, e Lei 8.009/90), pois, na hipótese, a proteção legal não tem por alvo o devedor, mas a entidade familiar, que goza de amparo especial da Carta Magna.
III – Tratando-se de questão controvertida, a interposição dos recursos cabíveis por parte dos executados, com o objetivo de fazer prevalecer a tese que melhor atende aos seus interesses, não constitui ato atentatório à dignidade da justiça. Inaplicável, portanto, a multa imposta pelo acórdão recorrido com base no artigo 600 do Código de Processo Civil, Recurso especial parcialmente provido, apenas para excluir a multa imposta aos recorrentes.
(STJ, 3ª Turma, RESP 351932/SP, DJU 09.12.2003, Rel. p/Acórdão Min. Castro Filho)
O Superior Tribunal de Justiça não está inovando ou indo contra texto expresso da Constituição Federal de 1988, ao contrário. Vejamos o Art 6 da CF 1988, o chamado Piso Vital Mínimo (cláusulas imutáveis) para a pessoa se viver com dignidade:
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Na realidade o que há é um desalinhamento entre o Art. 6º, o Art. 226 da CF 1988 e a Lei 8.009/90, o qual foi corrigido pelo Sumula 364 do STJ.
Vamos ao texto da Lei 8.009/90:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
Art. 2º Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.
Parágrafo único. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo.
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
I – em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; (Revogado pela Lei Complementar nº 150, de 2015) – Estatuto das Empregadas Domésticas)
II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; (Redação dada pela Lei nº 13.144 de 2015)
IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Como podemos observar o Bem de Família não pode ser invocado contra tudo e contra todos. Há limites e regras que devem ser observadas; algumas advindas da Lei 8.009/90 e outras da interpretação dessa Lei e da Constituição Federal de 1988.
Mencionamos um detalhe que pode fazer muita diferença numa locação. É a diferença entre Caução e Fiança que são 2 das formas de se garantir um contrato de locação.
Na garantia conhecida como Caução o Contrato efetivamente não estará garantido se o Caucionante tiver um único imóvel.
Na Fiança está por força do Art. 3º, inc. VII da Lei 8.009/90 e o fiador pode perder seu imóvel.
O Direito ao Bem de Família e por conseguinte a impenhorabilidade também pode ser invocada com eficácia:
1 – Se pessoa morar sozinha ou for solteira.
2 – Se a pessoa tendo um único imóvel, este estiver alugado e a renda for revertida para a família – Súmula 486 STJ.